30/11/2008

O gênio, assim como o demônio, está nos detalhes. "Queime antes de ler" dá sequência à fieira de filmes brilhantes dos irmãos Cohen. Trata-se de uma comédia, como seria mesmo de bom alvitre, depois do realismo cru de "Onde os fracos não têm vez". Estão lá todos os elementos que fazem dos Cohen os melhores diretores hoje em atividade: humor, violência e tramas sinuosas, extremamente bem construídas. Nos detalhes (e isso é o melhor do filme), a crítica mordaz ao modus vivendi americano: uma mulher que quer fazer plástica e lipo, mas o plano de saúde não cobre. Um agente da CIA demitido por alcoolismo que não passa de um idiota (ele é traído pela mulher, que o trai também com um idiota da televisão. O homem que come a mulher do ex-agente da CIA, por sua vez, é um paranóico e viciado em sexo.) O Brad Pitt (finalmente os
Cohen tiveram dinheiro para contratar atores de primeira linha. É o efeito Oscar), imaginem só, é morto pelo cara que come a mulher do agente. (É sensacional matar o Brad Pitt, pensem bem. Nesse caso, ele tem de ser um personagem secundário, anódino, como de fato é, no filme). No final, tudo vira uma tremenda bagunça e a CIA se envolve para "limpar" a sujeira. E os caras da cúpula da CIA balançam a cabeça, falando: "Mas que porra foi que nós fizemos...", à semelhança do final de os "Os fracos não têm vez". É uma comédia sardônica, sem perdão. Merece ainda mais análises.

28/11/2008

27/11/2008

A vida não podia ser bela

É difícil um filme tão errado quanto "A vida é bela", do Roberto Begnini. Por mais que se tente dar um desconto (afinal trata-se de um comediante), nada ali parece fazer sentido: esconder um menino, em pleno campo de concentração? Impossível. Fazer piadinhas com soldados nazistas? Quer morrer, maluco? Onde, exatamente, localiza-se este campo de concentração? Na Alemanha? Na Itália? Se na Alemanha, então como é que tanques norte-americanos foram parar lá? (Seria mais correto se fossem tanques soviéticos). Uma garota, num campo nazista, sem os cabelos raspados? Está ali porque é mulher do diretor... E como é que a vida podia ser bela, em pleno campo de extermínio? Begnini, ator e diretor italiano, não conhece, não viu, os filmes italianos neo-realistas? Quosque tandem, Catilina?! O filme presta um mau serviço ao melhor entendimento da história da Segunda Guerra. Ainda bem que Begnini parou de abordar o assunto.

24/11/2008

Isto é Fassbinder

Fassbinder é um diretor originário do teatro. Por isso, seus planos são longos, a ênfase é para a performance dos atores. Não há paralelismos griffithianos, não há nada que lembre Hollywood. Movimentos de câmera belíssimos mostram um cinema de expressões pesadas, contrastes entre luz e sombra, luzes vagabundas de neons, reflexos de rostos sempre no limite do desespero. Franz Biberkopf continua sua saga pela República de Weimar, alguém que se vê obrigado a aceitar as condições que a vida lhe impõe, em face de um destino trágico. Em dado momento, perde o braço, bestamente, numa cilada armada por bandidos. É assim, sem braço, pobre, alcoólatra e ex-presidiário que enfrenta sua realidade, a realidade de um homem comum. Poderia ser um de nós...

23/11/2008

Berlin Alexanderplatz

Se gosto dessas mulheres desesperadas, desgrenhadas, à beira de um ataque de nervos? Se gosto desses homens estiolados, no limite entre a sanidade asséptica e a loucura como única forma de transitar por um mundo também insano? Se gosto dessa Alemanha expressionista, escura e claustrofóbica, lembrando uma tela de Max Beckman? Berlin Alexanderplatz: 16 horas de êxtase perturbador. Não consigo me identificar com Franz Biberkopf – protagonista do filme –, entretanto, que me parece mais um cidadão comum (naquilo que o cidadão comum também tem de idiota), em busca de inserção numa sociedade que aos poucos se desmorona, a Alemanha do entre-guerras. Ainda não terminei de ver o filme, estou no 6º de 12 episódios. Mais comentários daqui a pouco.

21/11/2008


O amor só é possível entre dois sadomasoquistas.

18/11/2008

17/11/2008

13/11/2008

Dias atrás, sonhei que retalhava um cara, com muita ciência e dedicação. Outra noite, sonhei que estava no centro, pessoas dormiam na calçada, em meio à sujeira, à urina e às fezes. Já ontem, sonhei com mulheres incríveis na minha cama, entre as minhas pernas. Estranho, muito estranho.

11/11/2008

Grande hotel

O roteiro é conhecido: vêm, hospedam-se em sua cabeça, deitam-se em seu corpo, esbaldam-se em seus lençóis. Passado algum tempo, reclamam da mobília, do serviço de quarto, da comida, da decoração do teto, até chegarem ao seu físico de atleta. Pronto: de hotel 5 estrelas, foi reduzido a uma espelunca. Daí se mudam porque queriam um quatro quartos, com vista definitiva, de preferência para o mar. Mas continuam morando de aluguel...

Auto-retrato em meio aos trastes




02/11/2008

Culinária e automobilismo

Fui almoçar feijão tropeiro num boteco aqui perto. Perguntei ao garçom: "Vem com ovo?". Ao que ele ripostou: "Vem completo, com ovo, trava elétrica, holofote traseiro, ar condicionado..." A metáfora não era exatamente persuasiva para quem, como eu, nem ao menos sabe dirigir. Além do mais, se o tropeiro fosse um carro, seria certamente um Fiat 147. Mas valeu pela criatividade do sujeito.

Mais frases para desanuviar (*)

No Brasil, o gene da honestidade é recessivo.

Jamais confunda: natureza-morta com despacho de macumba.

Bebia tanto que não fazia exame de sangue: media o teor alcoólico.

Era um escritor muito pouco original. Sua única grande obra foi um livro de citações.

A fisicultura é a burocracia do corpo.

O dinheiro é o Viagra do intelecto.

Era tão precoce que aos 16 já vivia a crise dos quarenta.

*Estas frases são do final dos anos 90. Junto com outras tantas (pelo menos umas 40), estavam num arquivo que a minha ex-mulher entendeu de deletar sei lá porquê.

01/11/2008

Joy Division

Vamos combinar: eu gosto de rock’n’roll, fazer o quê? Fui ver “Joy Division”, um documentário sobre este grupo de finais dos anos 70 e início dos 80. O diretor mescla a trajetória da banda à história da cidade de Manchester, bombardeada na II Guerra e hoje uma grande e moderna, no bom sentido, cidade inglesa. Há imagens poderosas, como fotografias de como era Manchester nos anos 70: construções horríveis, à maneira de enormes hospitais ou sanatórios dominavam a paisagem. Muitas fábricas, pessoas criadas para não serem mais que operários, degradação: exatamente o cenário vazio de sentido descrito nas letras de Ian Curtis, poeta tresloucado, para lá de deprê e vocalista do Joy Division. Há entrevistas com os outros três membros da banda, com as ex do Ian Curtis e com os criadores da sonoridade industrial dos caras (engenheiros de som, produtores, etc.). Deborah Curtis é um show à parte: linda ainda hoje e inteligente. Foi depois de uma briga com ela e depois de ter visto o filme “Strozeck”, de Werner Herzog, que Ian Curtis deu cabo da própria vida. O filme, em suma, é uma ótima viagem no tempo, de volta ao espírito dos oitenta, dark, pesadão, sufocante, super fim de século. Ouvi as canções do Joy Division, no rádio, somente no final dos anos 80. Naquela época já carregava pra cima e pra baixo um livro de capa totalmente branca, sem título, com as letras do Ian Curtis. Nada muito genial, o filme é somente mais um documentário sobre banda, como há muitos por aí. O detalhe é que foi uma das melhores bandas de todos os tempos. Valeu o ingresso.